Papo de sambista com o Mestre Tornado
Atualizado: 19 de ago. de 2019
Com mais de 30 anos de carnaval, sua história acumula títulos e notas 40
José Jorge Teles Santos, mais conhecido como Tornado, nasceu em Salvador, Bahia, e se mudou para São Paulo com apenas 3 anos de idade. Sua trajetória no mundo do Carnaval começou aos 7 anos por conta de sua família que frequentava escolas de samba e, desde então, não parou mais. Depois de alguns anos, Tornado passou a ser ritmista de escolas como a histórica Paulistano da Glória, Gaviões da Fiel, Portela, Barroca Zona Sul, Vai-Vai e X-9 Paulistana ─ onde se tornou diretor e, logo depois, mestre de bateria.
Depois de 7 anos como mestre de bateria da X-9, Tornado recebeu um convite da escola de samba Rosas de Ouro onde foi campeão do Carnaval paulistano em 2010. Em 2013, Tornado saiu da agremiação e decidiu que não queria desfilar por um tempo, porém, recebeu o convite da Imperador do Ipiranga e realizou o Carnaval de 2014 pela escola da Vila Carioca. Por fim, no mesmo ano, Tornado passou a ser mestre de bateria da Dragões da Real onde permanece até hoje.
No último sábado, 27, durante a formatura da escolinha de bateria, mestre Tornado contou ao Blog Tertulianas sobre sua vida no mundo do samba, seu comando a frente da Ritmo que Incendeia e as características da bateria.
Como funciona a escolinha de bateria da Ritmo que Incendeia?
Eu até prefiro que tenha pessoas que não saibam tocar, que tenham o primeiro contato com o instrumento na escolinha. As pessoas chegam aqui querendo tocar o tamborim porque acha que é pequeno e fácil, porém, é um dos mais difíceis que tem, aí a gente procura passar para a pessoa qual o melhor instrumento que ela vai se adaptar. A função da escolinha de bateria é criar novos ritmistas.
Ao fim da escolinha existe alguma prova prática para então ingressar para principal?
Nós fazemos uma pré-seleção de instrumentos. Esse ano recebemos 740 inscrições, começamos aos sábados o dia todo, com uma hora pra cada instrumento e então vamos adequando as pessoas a eles. Durante esse tempo, cada naipe tem um diretor, aí fazemos iniciante, pré e avançado. Conforme o tempo muitos desistem porque é desgastante, mas depois fazemos essa pré-seleção e ela funciona como um vestibulinho.
Como você analisa a evolução da bateria ao longo dos anos?
Modéstia parte? Show de bola (risos). Eu cheguei aqui e a bateria estava meio dividida, a escola não tinha uma padronização nesse quesito. Eu acho que a bateria de uma escola de samba tem que ser escutada de longe e você reconhecer de quem ela é, não podemos ter qualquer nota. Então buscamos essa padronização na batida de caixa, repinique, surdo, para então ficar uma bateria boa de se ouvir.
Você pode destacar um momento especial do último carnaval?
O que é legal no desfile, além de você estar satisfazendo sua comunidade, é satisfazer quem está assistindo e eu trago muito a arquibancada para gente. Quando fazemos a bossa que a arquibancada levanta e bate palma, é o ápice não só para mim, como também para bateria que ensaiou o ano todo, então isso me deixa feliz e consequentemente a nota que a escola precisa.
Como você prefere a afinação dos surdos na bateria?
Terceira alta, muito alta mesmo, parecendo coquinho e primeira e segunda depende muito do que eu tenho no enredo, não é uma padronização. Primeira e segunda vai muito se eu quero uma bateria muito alta ou muito baixa. Afinação é uma coisa muito pessoal né? Tem alguns truques também que todo mestre tem.
Qual batida de caixa você usa?
A batida de caixa eu trouxe um pouco do Salgueiro e um pouco do Império Serrano. Misturei as duas, cheguei aqui e falei para o pessoal (meus diretores), só que nenhuma foi aceita porque não ficou do jeito que queríamos. Aí resolvemos fazer uma batida quase que tradicional, é uma coisa meio quadradinha, mas é uma coisa funcional. Por enquanto é essa, mas vou mudar (risos).
O que você preza no naipe de chocalho?
Precisão na retomada, precisão no tocar. Chocalho é um instrumento que vaza muito por ser totalmente de metal, então se eu tiver um naipe de vinte, que apenas um estiver tocando diferente, todo mundo vai perceber. Sempre é precisão tanto nas bossas como nas viradas, chocalho é muito braço.
Como você prefere os desenhos de tamborim, mais simples e objetivos ou com contratempo?
Além de um bom carreteiro, liso, eu acho que o melhor em uma bateria, é o mais simples que sai mais bonito. Hoje a bateria de uma escola de samba não é julgada por muitos desenhos, é julgada pela precisão, pela manutenção do ritmo, então o simples é mais bonito.
Qual som coincide mais com a batucada da sua bateria, de um repinique mais grave ou mais agudo?
Eu tenho os dois, mais grave, mais agudo, tenho o repinique normal, tenho o repinique bossa. Depende muito da afinação e o jeito como eu quero a bateria, aí eu afino para baixo ou para cima.
Por que os desenhos de agogô têm uma característica mais forte?
Eu como filho de Ogum, sempre gostei de ter uma linha de aço na frente, no caso o agogô, e o nosso é fabricado no Rio de Janeiro. É muito mais alto porque lá tem bateria com 300, 350, então o som de lá é bem mais alto do que aqui. O Rafa gosta muito de desenho, aí ele desenha com tamborim, chocalho, surdo de terceira, então deixei livre porque para mim é o melhor agogô de São Paulo.
Qual o momento exato para encaixar uma bossa no samba enredo?
Depende muito do samba, mas eu sempre solto uma bossa quando eu sinto que a bateria está cansada, quando eu vejo que o ritmo está dando uma caída. Aí é parte que eu falei da arquibancada vir junto, você solta um bossa, a arquibancada aplaude e os ritmista voltam com mais tesão, com mais vontade porque foi executado com perfeição.
Qual a importância de um esquenta bom para começar o desfile?
O esquenta é a mesma coisa de quando você namora, se tiver um pré legal, o final não sai legal? É mesma coisa na bateria, tem que fazer um esquenta legal, para entrar na avenida bem. Eu faço esquenta na pré-concentração, na concentração e quando eu adentro na avenida eu faço uma bossa para a segurança minha e deles. Então um bom esquenta é um bom ‘’pré-amor’’ (risos).
Qual a maior característica da sua bateria?
O comprometimento dos meus ritmistas, eu já tive ensaio de bateria aqui com 200. E também o respeito que tenho por eles, acho que isso é essencial para um mestre de bateria.
Como é ser jurado de uma competição de bateria universitária?
É difícil, eu já fui por duas ou três vezes, aliás, uma aqui em São Paulo e três fora. É um outro mundo, e você vai julgar com um olhar de carnaval fica muito difícil, é capaz de você pontuar algumas coisas que deixam as pessoas chateadas, então preferi sair desse meio. Eu apoio, tanto é que faço concurso aqui, esse ano nós vamos ter dez baterias. Mas eu prefiro não julgar, fico só observando, aplaudindo, está tendo um crescimento muito grande e tem todo meu apoio.
Quais mestres você tem como inspiração?
Todos aqueles que eu passei pelas mãos deles. Mestre Bolinha na Paulistano da Glória, mestre Binha na Barroca Zona Sul, mestre Tadeu, mestre Daga que foi da Gaviões e o mestre Adamastor. Os de hoje, são todos bons, respeito todos, parabéns a todos e bora junto!
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